segunda-feira, 25 de abril de 2011

NOTÍCIA:

Publicado em 25/04/2011

Começa a funcionar o Juizado Especial de Defesa do Torcedor

O Tribunal de Justiça de São Paulo iniciou, no sábado (23), o funcionamento do Juizado Especial de Defesa do Torcedor, em uma das partidas das quartas de final do Campeonato Paulista de Futebol. O jogo aconteceu no estádio do Pacaembu, às 18h30, entre Corinthians x Oeste.

Para o desembagador Guilherme Strenger, que coordena o Juizado do Torcedor, o serviço tem caráter inibidor. “Estatísticas do antigo modelo de juizado, que funcionava nos estádios desde 2006, mostram que a presença do Judiciário numa partida de futebol reduz em cerca de 60% o número de ocorrências”, disse ele.

Na estreia do Juizado do Torcedor, apenas uma ocorrência foi registrada. Um rapaz, que não tinha antecedentes criminais, foi acusado de desacato à autoridade. O processo foi recebido no juizado e, como não houve composição (acordo), terá continuidade no Fórum Criminal da Barra Funda. O homem não foi preso.

O Juizado do Torcedor vem para substituir, nas competições esportivas, o antigo Jecrim (Juizado Especial Criminal), que tinha competência para atender apenas ocorrências de menor potencial ofensivo, com penas de até dois anos. Agora, é possível receber também casos de fraude nos resultados das competições e atividade de cambista.

Além disso, o Juizado passou a atender questões da área cível, onde o espectador pode exigir os direitos estabelecidos pelo Estatuto do Torcedor, como banheiros em condições de uso, assentos marcados e segurança nos estádios.

Saiba mais - O TJSP criou uma página na internet para esclarecer aos torcedores quais são seus direitos e deveres, os crimes previstos no Estatuto e explicar como funciona o juizado (www.tjsp.jus.br/juizadodotorcedor). Nesse espaço, também, é possível acompanhar uma história em quadrinhos, que será constantemente atualizada, e “cujo objetivo é atingir crianças e adolescentes com mensagens didáticas e educar os futuros torcedores”, explica Sérgio Hideo Okabayashi, juiz assessor da presidência da Seção de Direito Criminal, que idealizou as tiras e contou com a colaboração técnica da Secretaria de Tecnologia da Informação (STI) do TJSP. A ideia é, no futuro, fazer uma versão impressa para ser distribuída nas escolas.

Para a implantação da infraestrutura do juizado, o Tribunal firmou parceria com o Ministério dos Esportes e contou com o apoio da Federação Paulista de Futebol e da Associação Paulista de Magistrados (Apamagis).

Além do desembargador Guilherme Strenger, a comissão que coordena o Juizado Especial de Defesa do Torcedor também é composta pelo desembargador Sérgio Ribas e pelo juiz Miguel Marques e Silva.

Fonte: Tribunal de Justiça - SP

sexta-feira, 15 de abril de 2011

RETORNO DOS CRAQUES: REFLEXÕES JURÍDICAS

Dr. Jorge Luiz Azevedo Nunes*

O futebol brasileiro está passando por um momento peculiar, de retorno de atletas consagrados mundialmente do futebol europeu para clubes do nosso país. Em que pese ainda não ter havido o retorno de qualquer atleta na melhor fase da carreira desde Romário em 1995, que retornou ao Brasil para jogar pelo Flamengo pouco depois de ser eleito o melhor jogador do mundo no ano anterior pela FIFA, jogadores que retornaram, como Rivaldo, Deco, Roberto Carlos, Fred, Robinho e, principalmente, Ronaldo e Ronaldinho, atraem grande atenção da mídia, dos fãs de futebol em geral e, principalmente, de grandes empresas, dispostas a investir cifras milionárias nas agremiações que contam com esses craques.

Nenhum desses recentes retornos, conforme já mencionado, ocorreram no auge da forma técnica ou até física. Esses atletas não exibiram na maioria dos jogos dos seus respectivos clubes todo talento de outrora, exibidos em clubes da Europa ou mesmo na seleção brasileira, seja em razão de declínio técnico, de idade elevada, de má condição física e, em alguns casos, de todos estes fatores. Contudo, ainda assim, foram decisivos nos poucos momentos em que exibiram plenamente o talento que possuem. Vide o exemplo de Ronaldo, que, apesar de ficar afastado de boa parte das partidas do Corinthians no período em que lá esteve, ganhou dois campeonatos na condição de protagonista, ou de Adriano que, apesar de ter tido uma conturbada passagem pelo Flamengo, foi decisivo para a conquista do campeonato brasileiro pelo clube.

No entanto, os maiores benefícios para os clubes com estes retornos ocorrem fora das quatro linhas, tratando-se da geração de receitas com a possibilidade de explorar a boa reputação destes jogadores com ações de marketing e, principalmente, com a atração de patrocínios.

Os atletas estão atuando como “parceiros” dos clubes na captação de patrocínios. Robinho, por exemplo, em sua recente passagem pelo Santos fechou contrato particular com a empresa de gênero alimentícios SEARA, atraindo a mesma empresa para patrocinar o Santos. Através de Ronaldo, o Corinthians atraiu o patrocínio da VISA e do Banco Panamericano, entre outras empresas do mesmo porte. Esta é a única forma de manter a remuneração dos atletas “retornados” no mesmo patamar do mercado europeu.

No caso de Ronaldo, por exemplo, o Corinthians pagava R$ 400.000,00 por mês, mas o seu rendimento mensal chegava a R$ 2.000.000,00, em razão da participação do agora ex-atleta na renda obtida pelo clube através dos patrocínios. Em praticamente todos os contratos desses bem sucedidos atletas que retornaram da Europa, constam cláusulas neste sentido, inseridas, conforme argüido pelos clubes e pelos representantes dos jogadores, para manter o equilíbrio financeiro do contrato, já que clubes brasileiros não possuem estabilidade financeira a ponto de garantir isoladamente que os atletas sejam remunerados nos valores praticados na Europa. No caso mais recente de uma transferência desta natureza, a de Ronaldinho Gaúcho, a empresa de marketing esportivo TRAFFIC estaria presente na relação jurídica como uma espécie de avalista, para garantir os rendimentos do atleta caso o Flamengo não consiga arcar com estes.

Muito se tem discutido sobre se seria válido atrair estes atletas ao futebol brasileiro nesses moldes, se traz um acréscimo de qualidade aos clubes, se somente financeiro ou nem isso. Contudo, pouco se tem comentado sobre aspectos importantes destes contratos, como, por exemplo, os de natureza trabalhista.
O art. 2º da Lei 6.354/1976, que dispõe sobre as relações de trabalho do atleta profissional de futebol, estabelece, no mesmo sentido do art. 3º da CLT, que o atleta que praticar futebol subordinado a um empregador (clube), mediante remuneração e contrato é empregado, decorrendo o vínculo desportivo do empregatício. Agora, pergunta-se: como o clube empregador de um atleta que recebe uma quantia milionária, muito maior do que os outros atletas da equipe e ainda atua como parceiro na captação de negócios vai ter condições de utilizar todos os poderes inerentes à condição de empregador perante o aludido profissional?

A prática vem mostrando que isso não vem ocorrendo. É inegável que o vínculo de subordinação com o empregador fica mais tênue nesses casos em que os atletas atuam praticamente em parceria com os clubes em ações de marketing e para obtenção de patrocínios, alem de receberem salários muito superiores aos dos outros atletas da própria equipe. Esses atletas consagrados muitas vezes faltam treinos, se atrasam na volta das férias, sem que sofram qualquer punição. Isso, sem dúvida, gera um descontentamento nos outros atletas, que sofrem as punições inerentes da relação empregatícia nesses casos, interferindo negativamente no rendimento esportivo da equipe.

Além disso, outro aspecto a ser verificado é que, os atletas consagrados que retornam ao Brasil, conforme já mencionado, muitas vezes recebem a maior parte dos seus rendimentos dos patrocinadores. Contudo, configurada a natureza salarial desses pagamentos realizados através de patrocínios, haverá incidência dos encargos trabalhistas sobre todo o valor recebido pelo atleta, o que pode acarretar em desagradáveis e vultosas reclamações trabalhistas em face dos clubes que estejam levando em conta para tais fins apenas o salário que paga aos atletas, ou até mesmo em face das empresas patrocinadoras, caso seja configurado vínculo empregatício direto entre elas e os atletas, tudo isso a depender de cada caso concreto.

Mesmo que craques consagrados estejam retornando ao país longe da melhor forma física e do ápice técnico, tais retornos causam um acréscimo de qualidade ao futebol nacional, atraem mais interesse do público e, com contratos bem elaborados, podem ser bastante rentáveis às associações futebolísticas. No entanto, para que tudo isso possa continuar ocorrendo, os dirigentes dos clubes, bem como os atletas e seus representantes, devem possuir plena ciência de que estes futebolistas são, apesar das vultosas quantias que auferem, empregados dos clubes, devendo cumprir com os deveres legais inerentes à condição de subordinado, sem prejuízo dos direitos trabalhistas, a que fazem jus, cuja observância também é essencial para a continuidade da interessante experiência do retorno dos maiores ídolos nacionais aos gramados brasileiros.

Jorge Luís Azevedo Nunes - Advogado do núcleo de negócios em Direito Desportivo do MBAF Consultores e Advogados S/S. Pós Graduado em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela Faculdade Baiana de Direito. esportivo@mbaf.com.br

Artigo publicado no Limeira Esporte.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

DIREITO DESPORTIVO: RAMO AUTÔNOMO?

Dr. Yan Meirelles.

O esporte deixou de ser apenas uma simples e prazerosa atividade física para se tornar uma atividade altamente lucrativa e um expoente da “indústria” do entretenimento, que muito cresce em todo mundo.

Como não poderia deixar de ser, houve uma grande expansão do Direito Desportivo, como consequência do crescimento exponencial das demandas e oportunidades na área, o que está despertando em uma nova geração de especialistas o interesse e a dedicação à matéria. Nessa direção, estão se firmando no mercado escritórios de advocacia especializados ou com segmentos exclusivamente direcionados para atender clientes com interesses no universo dos desportos.

O aumento dos conflitos nas relações entre as partes integrantes do universo esportivo, por conta de uma crescente profissionalização do esporte em todo mundo, bem como as exigências do mercado no que diz respeito à interpretação da legislação, a defesa dos direitos do torcedor, a defesa dos acusados por doping, a necessidade de elaboração de contratos mais seguros e consistentes para a relação de trabalho entre atletas e clubes, a adequação das estruturas das associações desportivas e empresas do ramo e as mudanças na legislação, fazem parte do dia-a-dia desses escritórios.

No entanto, para melhor compreensão desta realidade, faz-se necessário um histórico do Direito Desportivo no Brasil, cuja evolução coincide com a própria evolução do esporte em geral.

Numa análise inicial temos que o direito desportivo em todo mundo surgiu através de normas sociais e regras do esporte. A prática, cada vez maior, nas mais variadas modalidades esportivas, exercidas individual e coletivamente, foi à fonte geradora das normas e regras das competições. E isso não foi diferente no Brasil.

Em 1901, com a criação da Liga Paulista de Foot-Ball, a primeira associação de futebol do país, nasceu o Direito Desportivo no Brasil. No ano de 1914, surge a Federação Brasileira de Sports (FBS) e em 1941 entrar em vigor o Decreto-Lei nº 3199/41, o qual criou o Conselho Nacional de Desportos (CND), órgão que tinha competência para legislar sobre a matéria, bem como julgar em sede recursal.

Posteriormente, a Portaria 24/41 e a resolução 4/42 criaram o Tribunal de Penas, órgão desde então competente para julgar infrações cometidas por atletas, árbitros, clubes e seus dirigentes. Três anos depois, foi elaborado o Código Brasileiro de Futebol, que normatizou e organizou os tribunais.

Logo, à época, os órgãos judicantes na esfera esportiva tinham as seguintes atribuições: Ao Conselho Nacional de Desportos foi atribuído o poder judicante, ao STJD a jurisdição em todo o território nacional, ao TJD a jurisdição nos territórios estaduais e nos Municípios as Juntas Disciplinares Desportivas. Em 1962 foi aprovado pelo CND o Código Brasileiro de Disciplina do Futebol e o Código Brasileiro de Justiça e Disciplina Desportiva.


Contudo, foi em 1988, com a promulgação da Nova Constituição Federal, que restou reconhecida a Justiça Desportiva como órgão competente para apreciar e julgar as demandas decorrentes dos conflitos na seara esportiva e criou os pilares do reconhecimento do Direito Desportivo como um ramo de Direito.


E isso se deu por conta do teor do art. 217 da Carta Magna de 1988, que dispõe:

Art. 217 - É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observados:
I - a autonomia das entidades desportivas dirigentes e associações, quanto a sua organização e funcionamento;
II - a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos específicos, para a do desporto de alto rendimento;
III - o tratamento diferenciado para o desporto profissional e o não-profissional;
IV - a proteção e o incentivo às manifestações desportivas de criação nacional.

§ - O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, reguladas em lei.

§ 2º - A justiça desportiva terá o prazo máximo de sessenta dias, contados da instauração do processo, para proferir decisão final.

§ 3º - O Poder Público incentivará o lazer, como forma de promoção social.

A partir da análise do dispositivo constitucional supratranscrito, insta salientar que, para a farta compreensão do motivo que justifique a inserção do Direito Desportivo no ramo das matérias autônomas, necessário se faz elencar todos os pressupostos indispensáveis a tal reconhecimento.

Os pressupostos para o reconhecimento do Direito Desportivo como ramo autônomo se evidenciam na existência de uma rica construção doutrinária, jurisprudencial e, principalmente, na demonstração de diversos princípios e normas que sistematizam a referida matéria.

E estes princípios são extraídos principalmente do supratranscrito art. 217 da Constituição Federal, sendo alguns eles:
- autonomia desportiva;
- tratamento diferenciado entre o desporto profissional e o desporto não profissional;
- esgotamento de instâncias.

Além disso, outro fator que demonstra a autonomia do Direito Esportivo é a existência de ordenamento jurídico próprio, de natureza administrativa mas reconhecido constitucionalmente, regido por princípios e normas específicas, consolidadas através do CBJD. Assim, o Direito Esportivo desponta como um ramo promitente do Direito, integrado ao Ramo do Direito Privado, projetando-se em diversas esferas onde atingem todos os particulares envolvidos com o Esporte em geral.

Outra demonstração cabal da autonomia do Direito Esportivo é a relação deste com os diversos ramos do Direito. O Direito Esportivo jamais poderia ser considerado um sub-ramo de qualquer outro ramo do Direito, posto que possui a peculiaridade de se relacionar com as mais diversas áreas de conhecimento jurídico.

O Direito Desportivo é subjugado apenas à Constituição Federal, Lei Maior, que lhe conferiu autonomia e princípios próprios. Entretanto, há correlação direta com os mais variados ramos do Direito, ampliando área de atuação do profissional da área jurídico desportiva.

Por exemplo, existe relação direta Direito Desportivo com o Direito do Consumidor, posto que o Estatuto do Torcedor equipara o torcedor ao consumidor, inclusive determinando, no seu art. 40, a aplicação subsidiária do Código de Defesa do Consumidor nas relações entre torcedores e entidades esportivas.

Além disso, as sanções existentes no Estatuto do Torcedor tem aplicabilidade efetiva na esfera Penal. Também existe relação entre o Direito Desportivo e o Direito Processual Penal, posto que o CBJD determina a aplicação subsidiária do Código de Processo Penal na Justiça Desportiva.

Os Direitos de Personalidade, consagrados no Novo Código Civil, englobam a proveniência da personalidade dos atletas, relacionando-a com a imagem, reputação e integridade física destes.

Há que se ressaltar, ainda, a relação com o Direito do Trabalho e Processual do Trabalho, verificada no Contrato do Atleta com a entidade desportiva, na relação de trabalho e suas consequenciais. Relaciona-se, também, com o Direito Tributário, em razão da tributação desta relação de trabalho, das entidades desportivas e das transações envolvendo entidades desportivas. As próprias transações envolvendo entidades desportivas estrangeiras e suas consequenciais no Direito Pátrio demonstra a relação do Direito Desportivo com o Direito Internacional.

Nesta esteira de intelecção, uma simples pincelada acerca da área de atuação ligada ao Desporto demonstra o quão grandioso é o Universo Jurídico desse ramo, sem esquecer as consequências financeiras e a necessidade de profissionais gabaritados, conhecedores da matéria.

Paralelo à existência de correntes doutrinárias contrárias que justificam como ineficaz a criação de um corpo legislativo específico que discorra exclusivamente sobre o desporto, entendemos de forma diversa. Isso porque, a evolução social do desporto, as relações consectárias com os demais ramos jurídicos e a eminente necessidade de profissionalização das relações travadas nesse campo demonstram quanto é essencial à diferenciação autônoma dessa matéria.

Ademais, com a evidente ascensão das relações que decorrem dos Desportos, bem como a permanente mutabilidade social e grandes transformações nesta área, salutar que haja sistematização efetiva para o enfrentamento do tema. Nessa toada, o aumento das demandas estimula o crescimento de um mercado mais consolidado e especificamente técnico. É importante destacar ainda, que no Brasil, já existem cursos de graduação e pós-graduação destinadas a profissionalizar o advogado que busca militar com os Desportos.

Por todo exposto, verifica-se com clareza que o Direito Desportivo trata-se de realidade presente nas mais modernas comunidades, tendo em vista suas especificidades. É essencial que destaquemos um ramo exclusivo para tratar da resolução dos litígios ligados aos desportos por meio de profissionais exclusivamente capacitados para discorrer sobre o tema, abarcando toda relevância e destaque que a matéria merece.

Autor: *Yan Meirelles é advogado membro do Grupo de Negócios Desportivo do MBAF Consultores e Advogados. Procurador do Tribunal de Justiça Desportiva do Estado da Bahia. Especialista em Direito Tributário pelo JusPodvim. Artigo publicado no JUSBRASIL